domingo, 13 de novembro de 2011

Seis Marias

A primeira Maria,
Maria de fé,
comia e bebia
de olho na Sé;
corria pra igreja,
quando dava pé,
 e a missa assistia
com os olhos no chão.

A segunda Maria
da zona a primeira
puta, a vadia...
De qualquer maneira,
boa sertaneja,
na luta aprendera
e dançava, e comia
e transava no chão...

A terceira Maria
não era santa:
fumava e bebia
e gostava de samba.
Arrota e pragueja
na roda de bamba,
no meio da cantoria
e cospe no chão.

A quarta Maria,
casada com o Zé,
em casa vivia,
recatada que é.
Da diária peleja
de depois do café,
a que mais lhe doía
era limpar o chão.

A quinta Maria,
Maria estragada,
mas ninguém esquecia
de tão cobiçada
a rara beleza
da face rosada...
agora jazia,
dormindo no chão.

A sexta Maria,
senhora distinta
e, quem diria,
dona de quintas,
cavalga e veleja,
fotografa e pinta
e pisa à valia
a terra do chão.

Seis Marias,
seis estórias,
seis vidas vazias,
seis vãs memórias.
Terminam – ora veja!
sem louros, sem glória,
numa cova fria,
enterradas no chão. 

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Que fase é essa?

Nossa, que fase é essa?

Quando aparenta que vai,
acontece um “prá trás”
e tudo acaba de repente.
Pareço um barco que sai,
perde a direção do cais
e deriva, mercê da corrente.

Lá se vão dois anos.
Dois anos sem trabalho
me abalaram a confiança;
minha reserva de ganhos –
essa, já foi pro caralho:
esgotou-se minha poupança.

Velho, já não tenho mercado,
ninguém quer minha “experiência”
nem a minha “sabedoria”.
Velho e desempregado!
Eis a síntese da decadência,
da tristeza e da melancolia.

Nada que experimento fazer
funciona;  tudo dá errado,
mas não sem antes me animar.
Com a frustração, vem a vergonha de ser
esse sujeito fracassado
que reluto tanto em mostrar.

Vivendo de favores dos filhos.
de “bicos” e de promessas,
me angustio e me entedio,
me torturo e me humilho...
Eu, que já tive à beça,
hoje sou um saco vazio...

Vazio de sonhos,
vazio de esperança,
vazio de fé!
A sorte, eu suponho,
foi uma parceira de dança
e eu lhe pisei o pé.

O tempo passa,
o Sol brilha, a chuva cai...
mas nada muda em minha vida.
Eu rio (é, acho graça),
ao lembrar o que diria meu pai
em situação parecida:

“Homessa!!! Que porra de fase é essa???”

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Fim de noite

A sala vazia,
o livro no colo,
o som baixo,
a sensação de noite acabada.
Sobre a mesa,
largado,
o porta-retratos
de onde, antes,
você me sorria.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Angela Goulart

Angela Goulart, artista plástica, certa vez leu meus poemas.
Pareceu ter se interessado e, dias depois, mostrou-me alguns trabalhos que realizara, a partir do que os "escritos" lhe inspirara. Isso aconteceu em 1986.
Ainda tenhos aqueles trabalhos, embora não consiga mais identificar qual arte se refere a qual "escrito".
Eu gostaria de publicá-los neste blog, junto com os poemas, mas estou evitando fazê-lo sem a prévia autorização da autora.
Só que perdi o contato e, apesar de todos os recursos da internet, não consigo encontrá-la.
Onde anda você, Angela?

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O fim


Tornei-me um sujeito obscuro,
me humilho, me degrado,
me torturo
buscando respostas
que não sei responder,
sobre assuntos que desconheço.

Já não consigo dormir
mas mantenho meus sonhos, acordado,
e, sem ter onde ir,
as feridas expostas
para quem quiser ver,
buscando, talvez, o recomeço.

Despido, entre meus humores,
sangue, suor, fezes, urina,
relembro antigos amores,
tempos de relativo sucesso
quando tinha mais do que precisava,
e menos do que queria ter.

Rezo a deuses em quem não acredito
pedindo que mude minha sina
e me refaça jovem,  rico e bonito
- é só isso o que peço!
Que me permita o dom da palavra
e a completa realização do ser.
            
Mas a vida me trancou nessa cela escura,
          me humilha, me degrada, me tortura...

sábado, 27 de agosto de 2011

Pra quê?


Pra que brigarmos assim,
se isso não leva a nada,
se sei que gostas de mim,
se sabes que és minha amada?
Pra que cada um pro seu lado,
pra que os caminhos diversos,
pra que o evitar de sorrir,
pra que a fronte cerrada?
Se sempre te tenho falado
e insisto nestes versos,
que não temos onde ir
se não formos de mãos dadas?

Adeus

A opção de partir, foi tua;
o sorriso no adeus, foi teu;
a mim restaram a lágrima contida
e o enorme desejo
de te pedir para ficar.







Quero que você me veja


Quero que você me veja
descalço, sem camisa,
sentado à mesa de um bar.
Nas mãos um copo de cerveja,
no rosto, um sorriso
buscando o teu olhar

Abandonado


Celso, meu  irmão do meio, saiu de casa em um domingo pela manhã para jogar futebol, como sempre fazia. Não voltou mais para casa. Teve um AVC após o jogo e cinco dias depois faleceu.


Por que você partiu assim,
sem despedir-se de mim,
sem me avisar?
Saiu sem dizer o destino
e deixou um vazio clandestino
que não consigo expulsar.
Voltar?!  sei que você não vai voltar –
pra onde você foi, não tem volta.
Uma lágrima insiste em rolar,
de tristeza, de saudade, de revolta
porque você se foi assim.
Vai estar nos meus pesadelos,
na minha angústia, nos meus apelos
até o eterno sono do fim.